a marca da maldade

Crítica do filme ‘A marca da maldade’|Por Victor Russo

“A Marca da Maldade” é um dos melhores filmes noir da história do cinema, articulado pelo gênio Orson Welles. O maior erro desse filme (e não por culpa dele) é viver nas sombras. Afinal, ele não atinge o nível de “Cidadão Kane”, obra prima do diretor.

A beleza de “A Marca da Maldade” já começa com a inteligente escolha de usar como McGuffin –  algo que o protagonista deseja-  o assassinato da cena inicial, que acontece na fronteira entre México e Estados Unidos. O resurso  é construído de forma esplêndida com um maravilhoso plano sequência de mais de três minutos. A partir do momento que o público cria uma imersão com a investigação e fica curioso para descobrir quem é o responsável pelo crime, nos é apresentado Hank Quinlan, que desvia o foco do espectador desse mistério inicial.

Enredo e análise

Quinlan, interpretado por Welles, é o capitão de polícia responsável pela investigação. Apesar de ser respeitado por resolver todos os casos em que trabalhou, ele é a representação do mal em todos os sentidos imagináveis. Arrogante, preconceituoso e antiético –  a ponto de mudar as provas de um crime só para prender quem ele acredita ser o responsável. É também a representação do passado, tanto o lado positivo, já que usa sua experiência para prender criminosos, quanto o negativo, pois acredita estar acima do sistema e usa artifícios nada lógicos, como a intuição por causa de uma dor na perna.

Ele tinha tudo para ser o vilão clássico com todos os arquétipos da maldade. Porém, dois fatores tornam o personagem mais atraente e importante que o próprio protagonista, Miguel Vargas, vivido por Charlton Heston. O primeiro é a atuação impecável de Welles, que traz personalidade e realidade ao policial, tanto na amarga e temível expressão facial, quanto no trabalho corporal absurdo, com um jeito de se mover extremamente peculiar. O segundo é a construção do vilão, que traz uma justificativa para as ações de Quinlan. Ele teve sua esposa estrangulada e assassinada, e, graças a isso, prometeu nunca falhar na hora de pegar um criminoso, independente dos meios que seriam necessários.

E, se eu disse acima que ele é um policial antiético, o próprio roteiro nos mostra que nada é tão simples em se tratando de Hank Quinlan. Apesar de todo o mal que já citei, ele mantém uma moral própria, que fica bem clara quando se recusa a atirar em Vargas pelas costas. Ele é uma pessoa boa e um policial mal, mas ambas personalidades acabaram se misturando no processo, algo que aparece na fala de sua conhecida Tanya, Marlene Dietrich.

Quinlan rende horas e horas de estudo de personalidade. A cada vez que se assiste o filme, mais camadas ficam evidentes. Infelizmente o mesmo não pode ser dito de Vargas e Susie, Janet Leigh, que ficam presos a estereótipos de herói e donzela indefesa. Se o personagem de Heston funciona para mover a história, muito mais pelo seu carisma do que pela sua complexidade, com sua esposa acontece o oposto. E não se pode culpar a estrela Janet Leigh, já que a sua personagem é de longe a que mais sofre nas mãos do roteiro. É colocada para tomar decisões irracionais e fica presa a gritos e caras de espanto. Outro problema do filme é o fato da representatividade, já que Heston não convence em nenhum momento como mexicano, principalmente por causa do ridículo bigode mexicano que ele usa.

Porém, os dois pouco atrapalham “A Marca da Maldade”, já que o destaque de Quinlan e a maravilhosa direção de Welles, com a construção de uma atmosfera noir por meio de luz e sombra e com movimentos de câmera característicos do diretor, superam e muito os pouquíssimos defeitos da obra.

Victor Russo

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